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A imprensa que me tirou do armário, diz comediante Rodrigo Sant’anna | Tribuna Online

Os personagens expansivos e caricatos do ator Rodrigo Sant’anna, 44, são o oposto da postura adotada pelo comediante fora dos holofotes. Discreto, ele viu sua vida particular virar notícia em 2019 após subir ao altar com o então noivo numa cerimônia intimista. “Alguns sites da imprensa me tiraram do armário”, conta.
Apesar disso, ele conta que depois que o vídeo viralizou surgiu a vontade de levantar mais bandeiras e de se posicionar enquanto homem gay –uma mudança drástica em seu comportamento, até então reservado em relação à vida pessoal. “Na época em que eu comecei a minha carreira de ator, não sabia como iria repercutir [o fato de ser homossexual]. Existia um medo de ser agredido, achincalhado. Na escola eu sofria muito pelo jeito afeminado.”
No mês do orgulho LGBTQIA+, o artista relembra a “conquista” por receber a aceitação da mãe e fala sobre os avanços e retrocessos da sociedade sobre o tema. “É importante que essa questão seja debatida.”
Pergunta – O que significa o mês do orgulho LGBTQIA+ para você?
Resposta – Tudo o que traz visibilidade a uma minoria é relevante. Precisamos parar um mês para falar sobre representatividade, ter espaço nas emissoras, nos jornais. Sem dúvidas, é importante que essa questão seja debatida, conversada.
Pergunta – A sociedade avançou ou regrediu no combate à homofobia?
Resposta – Avançamos, mas em alguns momentos há um retrocesso dentro desse avanço. É difícil objetificar em palavras esse movimento que vivemos socialmente, mas parece que é um solta e puxa, um movimento elástico. E o público acaba sofrendo com essa consequência social.
Pergunta – Você é um cara bem resolvido com a sua orientação sexual?
Resposta – Hoje, sim, mas nem sempre fui. Até a minha família saber da minha orientação, eu tinha dificuldade em lidar. As primeiras pessoas a saber foram minha mãe e minha madrinha, elas que me criaram. Depois foi meu pai e, a partir daquele momento, foi uma virada de chave. Se um hétero pode [fazer qualquer coisa] eu também posso.
Pergunta – Você já teve medo?
Resposta – Por muitas vezes me senti cerceado em dar as mãos ao meu parceiro na rua ou fazer algum ato de carinho. Hoje não tenho mais esse receio, mas sabemos que a sociedade é preconceituosa.
Pergunta – Temeu perder fãs ou trabalhos?
Resposta – Na época em que eu comecei a minha carreira de ator, não sabia como iria repercutir, apesar de fazer comédia e muitos personagens femininos. Isso me abre precedente, mas eu ficava receoso. Existia um medo de ser agredido, achincalhado. Na escola eu sofria muito pelo jeito afeminado. Eram traumas que vinham à mente. A gente [público gay] ainda escuta muita piadinha.
Pergunta – De que tipo?
Resposta – Eu não sei o motivo, mas às vezes um hétero vem falar com um gay e ele tende a reproduzir o jeito mais afeminado como você fala. Isso eu acho muito chato. Repetir um maneirismo seu por conta da orientação, de um tom de voz. Parece que não é nada, mas eu considero desrespeito. Ressalta um estereótipo preconceituoso.
Pergunta – Quando você se assumiu gay publicamente?
Resposta – Eu me casei sem tornar isso público e em algum momento, alguns sites da imprensa me tiraram do armário. Amigos meus fotografaram a cerimônia [em 2019], e a notícia viralizou. Depois, eu comecei a dar entrevistas a respeito disso e virou uma pauta. Não gosto de deixar minha vida particular se tornar pública, não falo sobre relacionamentos, independentemente de sexualidade. Mas depois disso, comecei a achar relevante o fato de me posicionar, então já fiz mais questão de falar que sou gay e que tenho vontade de ter um filho, normalizar essa questão. É bom poder falar sobre isso em um almoço de domingo.
Pergunta – A sua família aceitou numa boa?
Resposta – Meu pai foi muito tranquilo, pois tenho uma relação mais diferente. Ele foi mais distante que minha mãe, portanto ele mesmo se sentia menos à vontade para cobrar qualquer postura minha. E minha mãe estava comigo ali do lado, me criou com minha madrinha. Claro que para elas foi um incômodo inicial. Minha mãe é católica daquelas que não deixam de ir à missa. A religiosidade, em algum momento, veio contra isso [a orientação sexual]. Com o tempo, ela foi entendendo que as coisas andam juntas e que eu gostar de homens não me faz menos conectado a Deus.
Pergunta – Teve um papo sério e definitivo com ela?
Resposta – Falei: ‘eu não tenho liberdade de expressar minha sexualidade de forma tranquila nas ruas’. Se não pudesse fazer isso em casa, iria acabar me sentindo distante dela. Hoje ela entende e foi uma conquista.
Pergunta – Muitas pessoas pedem conselhos a você para se assumirem?
Resposta – Recebo mais comentários sobre o ‘Tô de Graça’ [programa de humor que retornou ao Multishow], por [personagem Maria da Graça] ser uma mãezona que acolhe e não tem preconceitos. Uma mulher que protege os filhos independentemente de qualquer coisa.
Pergunta – Por falar em trabalho, quais são seus futuros projetos profissionais?
Resposta – Estou contratado pela Globo, tenho algumas coisas em andamento na casa. Sempre penso em algo que comunique com o público. Tive uma vivência grande em comunidade e ela é sempre representada a partir do crime, da ótica do tiro, da matança. E na comunidade tem muita coisa engraçada. Busco lançar um olhar bem-humorado e dar protagonismo às pessoas da favela. Sonho em fazer uma novela também.
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Fonte:Tribuna OnLine